sábado, 21 de janeiro de 2012

Nos dias de janeiro descubro um bom para 21. 
Avisto ao longe o movimento dos barcos e vejo por lá o ponto de origem. 
A deriva se mostra repentinamente no bater das ondas. 
Na armação, ponto de contemplar baleia, banho n’água o doce e o sal. 
Com o vento da bicicleta e todo o sol e verde da ilha, 
revisito 10 anos e a meninada que brotou disso. 
Estou longe. Longe de tudo que um dia conheci. Perto do dia que corre,
 da lagoa que vejo agora do alto da montanha. 
Penso na origem, ouço um pouco do que ficou esboçado; 
a apagar-se. 
Fico pensando se a memória para de pulsar
 em algum momento da vida. Porque o corpo repete aquele aperto quente
 quando encontra algum rastro do que agora ele é. 
A cigarra anuncia que o dia pode se pôr. 
Já passam das 8 e ele ainda clareia a varanda, apesar de toda a mata
 que nos cobre aqui no canto da lagoa. Restam frangipanis
 de outras terras e o barulho do motor do barco. 
Alguém aportará em instantes, sabe-se lá onde. 
Caída a noite, seguiremos para mais uma missão do máximo prazer possível. 
São dez dias no tempo do tempo. 10 passos além dali. 
De todos os Dalis. O cachorro late de cima do telhado e o vento 
norte não assusta tanto quanto o sul. Susto é bom. 
Garupa de moto pode ser tão bom quanto andar a cavalo. Pode?
 Não ando a cavalo há tempos. Há tempos sigo desejante
 do encontro com o torno e o barro. 
Há tempos espero, como se estivesse caminhando. 
Agora parece que caminho, na corrente do vento. 
 Ai, um respiro. Ai. Ai. Ai. 
Um respiro no aperto que vem quando cai o dia. 
Um respiro na alegria e nos encontros.
 Um silêncio que me deixa pertencer-me.
 Pertenço-me e vejo chegar a lua. Assim, em instantes. 
Saudades e saúdes estiveram hoje no mesmo prato de feijão com caipirinha. 
A cerâmica estala no forno. 
Uma peça antiga precisa sair para outra entrar. Entrar ar. 
Entra. Entrará.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

diante do sem fim de palavras
sem saber o que fazer com elas
sem saber o que fazer da vontade de saber
resta-nos descobrir o caminho por onde operar
o lugar onde o buraco é ainda raso
pronto para ser cavucado
ou
simplesmente olhado de cima
e esquecido numa transformação qualquer
num dia azul qualquer
numa tempestade de iansã
ou
numa simpatia à santa clara.
resta-nos escolher por onde passar
e correr, outra vez
ao vento
no tempo
das coisas
antes que a coisa em si
se perca na chuva de janeiro
no sol da marchinha de carnaval
no átimo do nada que vira argumento
que vira um nada
no nada
deste tudo que é um dia que vem
depois do outro.

domingo, 1 de janeiro de 2012

pentimento

dentro d'água
as lembranças guardadas
na caixa
perdiam a transparência
do ciano
e o magenta
da carne.
amarelavam.
perdiam a nitidez
em cada detalhe solvido em mar.

assim, podia-se escolher a lente
pela qual convinha olhar o passado.
podia-se lançar mão do calor da piscina,
da pinta no rosto da mãe.
podia-se reconstruir a memória futura,
afogar a palavra antiga,
rasgar a carta nunca lida.

podia-se escrever
cada cor da composição
com o amarelo.
podia-se refazer o velho.
o novo de novo de novo de novo todo novo.
mas ainda assim, escolheu-se
borrar do cinza do esboço
o ontem no dia de hoje.