quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

pra acabar de vez com o carinho pouco

banhar de água fria o fogo apagado
chover no molhado
correr de quem não está brincando de pegar
fingir que está dormindo quando ninguém está por perto

haja entre pra tanta borda.
haja pleonasmo pra tão pouca poesia.

domingo, 13 de novembro de 2011


Vinha de dentro aquela Coisa essa sem nome Que engasga de vento a garganta E o plexo de uma vez Que vem de vôo Atravessa o laranja Se instala em meu sexo E vaza em soluço expiro O rastro da coisa que existe Agora em lembrança que sauda O não vivido Como parte em mim Acarinhada De acordar em verso e sol Tão rápido e rasteiro Confundido cacuetado impresso Antes do além que não esteve Não por nunca estar Mas por estar em árvore Estrangeira.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

maturar é impreciso ou por um afogamento ao vivo e a cores

acordar.
ver escorrer a água.
deslizar.
erguer vôo para o nada.
tirar o pó.
saltar.
falir.
e dali, no meio dos cacos, entender no mosaico a possibilidade da reinvenção.

estranha epifania
exageros
emocionais
e outros extremos
essencialmente
equivocados.
(s)em mais.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

rato falho

do tapete
brotam os atos
falhos de rabos enormes
a medida da mordida meu corpo é incapaz de conhecer
o olho falsea a imagem
a boca abre e tranca um canto calado
noutro dia começam a sair de novo
pequeninos.
partículas rachadas, aceleradas
avançam.
insólitos, frios, inapreensíveis
não se sabe de onde vêm
a não ser pela vaga lembrança
do colo de nanar colchão
do ouvir o vento e a escuridão da noite
do fôlego que falta enquanto as pernas agarram o corpo
outro.
abofadas.
abafadas-afobadas
descuidadas, por demasia de cuidado
com o r desconhecido
este que vem antes do ato
que falta, que falha
fala sempre.
a palavra não dita
que se escondeu debaixo do carro
foi pega de assalto
e saiu pra conhecer o r
o que nunca se soube, que não quer saber, que sabe em demasia
transparente como o cuidado que falha
o r que sobra
o ato que falta.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

inunda-me.
sem choro nem vela
sem riso ou carinho
sem sequer estar presente

inunda-me
no tom mais roberto que o desavergonhamento permitir
inunda

assim

de chama e silêncio
de escrita e desejo

inapreensível inunda
perene desata

um para ti
outro para mim

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

estou entalada
de forma tão violenta quanto todas as brutalidades que tenho presenciado e vivido, dia após dia
assustada com o fato de a coisa ser parte tão parte de nós que nem sequer 
conseguimos perceber o que há de genuinamente violento nelas.
a cultura é transformada de forma violenta
a politicagem se disfarça terrivelmente de política
sem reflexão, cuidado, respeito.
violenta-se.
violentamente motoqueiros voam no trânsito
violentamente os corpos são mutilados
arrancados da casa e do desejo.
violentamente apropriam-se do discurso alheio
violentamente colocam palavras em nossas bocas.
violentamente são disparadas mentiras embotadas em quase verdades 
de violência vem recheado o amor.
de repente, violentamente vem o choro
que não se sabe explicar
a gota que transborda a água do copo chega como pedra.
pedras são violentamente atiradas
descuidadosamente, sem razão, sem desejo, sem direito, sem verdade.
"vontade de verdade".
vontade de verdade, por mais violenta que seja
amém.

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

terça-feira, 6 de setembro de 2011

hoje te peço permissão pra me fazer você


"(...) Em cada mulher existe uma morte silenciosa.
E enquanto o dorso imagina, sob os dedos,
os bordões da melodia,
a morte sobe pelos dedos, navega o sangue,
desfaz-se em embriaguez dentro do coração
                                        [ faminto.
— Oh cabra no vento e na urze, mulher nua sob
as mãos, mulher de ventre escarlate onde o sal
                                        [ põe o espírito,
mulher de pés no branco, transportadora
da morte e da alegria.

Dai-me uma mulher tão nova como a resina
e o cheiro da terra.
Com uma flecha em meu flanco, cantarei.
E enquanto manar de minha carne uma videira de
                                       [ sangue,
cantarei seu sorriso ardendo,
suas mamas de pura substância,
a curva quente dos cabelos.
Beberei sua boca, para depois cantar a morte
e a alegria da morte.

Dai-me um torso dobrado pela música, um ligeiro pescoço de planta,
onde uma chama comece a florir o espírito.
À tona da sua face se moverão as águas,
dentro da sua face estará a pedra da noite.
— Então cantarei a exaltante alegria da morte. (...)"

o amor em visita, herberto helder

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

os googles

raptaram-me por algumas horas. havia tanto de mim neste lugar, que fiquei atônita. bater na porta e perceber que não havia mais porta, nem teto, nem parede, nos faz ver toda a imensidão do de fora. sem coberta... devolveram-me. devolveram-me quase inteira. devolveram-me morta, outra. pediram desculpas, no melhor tom cristão. eles, que não têm corpo, que habitam nossos imaginários, que guardam nossos segredos e, vez ou outra, os sopram na noite para devolver os cacos no meio da madrugada.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

sim. estamos.

os dias estão correndo. eu estou correndo. correndo e vivendo um atropelo urgente. urgente e, inexplicavelmente, produtivo e tranquilizante.

nos últimos dias, várias mortes e nascimentos se fizeram diante de mim. e no meio do atropelo, também inexplicavelmente, foi possível parar, viver e seguir.

na última semana, uma mulher caiu na minha frente, no meio da rua e da multidão, cega, solitária e inabalável. cair talvez seja a forma encontrada por ela para estar com alguém, mesmo que por segundos. foi o modo de pedir o pastel. levantá-la, foi a minha maneira de comer junto e de respirar no meio de uma tarde cheia de sol, de sorrisos amarelos e desatenções. no último mês, da mesma forma, uma senhora caiu a 10 passos de mim; teve uma convulsão e, no meio do correr da tarde de domingo e inércia, o samu acreditou que a urgência não era tão urgente que não se pudesse esperar.

esperar. esperar é só o que fazemos. esperamos o retorno. esperamos a própria espera. esperamos encontrar. e esperamos não encontrar.

ontem decidi fazer de ônibus o trajeto até a ufmg. passaria lá a minha tarde, inventaria entraves burocráticos para fugir dos entraves que se faziam presentes no trabalho. a necessidade de produzir e dar sentido a qualquer coisa a cada minuto, termina por me afastar da produção da própria vida, distorce e evita os agenciamentos. mas, com ou sem recalque, quedamos) e agora somos nós), muitas vezes, felizes.

sei que há uma série de buracos no que aqui se tece. mas não há tempo. e a dinâmica do que aqui se escreve é tentar se resolver em 4 minutos. 4 min ---ut--os.s.o.s. despejo.

despejo mais uma vez, atrás do devaneio, o que agora me quis escapar. decidi pegar aquele ônibus, matar e fazer renascer aquela tarde. saudosistamente, se é que existe. no meio do caminho, um menino-homem, da minha idade (se é que se pode medir), pendurava-se em um ônibus. corria mais que as próprias pernas. o ônibus dele correu mais que o meu. menos de 4 minutos depois, meu ônibus se aproximava do dele. menos de 4 minutos depois, tornei a vê-lo. na total inércia. ele havia, e sinto alívio por não ter alcançado esta parte, se descolado do lugar onde havia grudado. ele não se dirigia. talvez, como (os) nós, não se dirigisse há tempos. ele estava no chão, esparramado na avenida antônio carlos, na frente do iapi. o que havia de mais concreto naquilo era que saía muito sangue da sua cabeça. não havia nenhum movimento. e ninguém corria ao seu encontro. era estranho. era "o estranho". nem a necessidade humana de estar diante do trágico, nem a vontade de matar, conseguiam fazer com que alguém chegasse de pronto àquele lugar. meu ônibus passou. não saltei. posso pensar que o fiz porque estava com pressa, porque não havia como descer naquele lugar. mas eu, simplesmente, não quis. não pude. não pude também acreditar em como aquilo reverberava dentro do ônibus em que eu estava. a vida seguia. eu ligava para o samu, mais uma vez. ligava da mesma forma que liguei quando vi um senhor sendo jogado no capô de um carro. motivo: ele existia ali, naquele momento. da mesma forma, a samu não viria. ligava porque foi o número que eu conheci no dia em que meu pai morreu.

recebi do médico uma resposta. sim, porque eles são muito próximos. eles te colocam para explicar, calmamente, o que está acontecendo. vem um médico e te ouve. sim, recebi, do médico, uma resposta: sinto muito, sílvia. eu trabalho com dados. preciso de um número que me diga exatamente onde está caída esta pessoa. de fato, iapi, na avenida antônio carlos, não é um número. pois bem, poderia ficar pensando sobre a palavra referência e devanear, inventar, levantar hipóteses absurdas ou não. mas não, não há tempo. nem para mim. nem para você.

agora, deparei-me com um texto que me fez parar. está em um lugar chamado "para não morrer em silêncio". para não morrer em silêncio. agora, é inevitável otimizar (escrevo isto e parece que vem uma vida inteira para se pensar sobre) estes 4 minutos para falar comigo. e com você. você, tão pertolonge, ouve sem ouvir com seu fone de ouvido celular. você que não me vê. você, que justamente por isso, conforta o ato da minha fala e me permite acreditar, neste 4 minutos agora tão dilatados, que sim. sim. estamos.

_aqui esgarçou-se o tempo, esqueceu-se o jogo, cuspiu-se a palavra quase engasgada.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

        eu derivo
        tu derivas
        ele der i va
        nós ainda derivamos
        vós derivais
        eles, vão eu derivo

tu derivas?
ele também
sinceramente, nós não derivamos
mas vós, às vezes, derivais

                                   eles não sabem o que estão perdendo

       eu não sei o que estou perdendo
       tu derivamos
                     ele derivávamos
      nós deliramos
      vós delirais
      e eles sempre delirarão.